segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

A Objetividade da Inocência

por Victo José da Silva Neto

Segunda, 25 de Janeiro de 2010. Aniversário da cidade de São Paulo. Estive em cumbica há pouco. Na volta, peguei o ônibus cumbica-tatuapé, e fui presenteado com um diálogo no assento atrás do meu, de uma família que havia, deduzo, acabado de receber os filhos de volta de uma viagem ao Nordeste, provavelmente familiares, pois o sotaque daquela região soava forte na conversação.
Os dois eram pequenos, um com 7(menor) outro com 9(maior), mais ou menos. Não pude conter algumas risadas de vez em quando, tamanha a eloquencia infantil que encontrei nos pequenos. O pai pouco falou, mas a mãe, interessada na viagem dos filhos, não os deixava tirar uma soneca após "três horas e vinte e cinco minutos de viagem do Recife para cá" segundo o maior. Deixo aqui algumas das anotações mentais que consigui "pescar":


- (maior) mãe, agente foi na praia todos os dias, eu nadei mas só no rasinho, porque lá no Recife é perigoso, tem tubarão.
- (menor) eu fiquei com medo depois que eu vi um tubarão assim pertinho assim do meu pé mãe, eu vi umas coisa dele assim saindo pra fora da agua.
- (mãe) voces comeram direito?
-( maior) comemo, tinha de tudo no café da manhã, fruta, suco. o tio alugo um carro e agente ia pras praias que eram muito longe, mas tinha que devolver o carro na quinta. ele disse "ces vão ve, amanhã vai faze um sol". Fez um sol danado, dito e feito.
-(menor) ele disse e voce fez?

-(mae) acho que peguei o menino errado, esse aqui ta muito preto! ce uso protetor?
-(maior) eu nao, o protetor era do (nome de um rapaz, nao pude ouvir) e eu não quis usar, muito caro aquilo, dai ia acabando assim...
-(mae) ces viram as maria farinha? aqueles sirizinhos brancos pequenininhos?
-(maior) vimo, eu peguei ela assim pela pata, mas dai ela começo a me da uns belisco assim com a otra e eu logo soltei. tinha uns grandão assim tamem que vinha na carrera e agente ficava com medo.

-(menor) a mãe arranjo emprego!
-(maior) eu sei
-(mae) ces vao ter que ficar na casa da vó por uns dias.
-(maior) mas lá nois fica muito preso, aquele videogame lá, a tia fica inventando historia.
-(mae) mas é o melhor pra nós, voces vão ficar lá. quando voltarem as aulas eu vou poder leva voces pra escola todo dia e i trabalha depois.
*silêncio de resignação*
-(maior) eu não queria fica na casa da vó...
-(menor) eu não queria crescer!

-(mae) ces nao viram a (nome do cachorro- nao pude ouvir) depois que ela voltou do veterinário! tá com brinco e piercing!
-(menor) eu quero ver!
-(maior) lá na praia tudo que era menina tinha piercing, eu que nunca vo colocar uma coisa medonha dessas
-(mae) mas menina é menina né
-(menor) eu queria te uma menina irmãzinha assim, daí era três, dois grande e uma pequena
-(maior) e quando eu fosse adulto ela era adolescente assim.. e eu não ia dexa os menino nem chega perto dela

-(mae) temo que chega logo, preciso ir começar a trabalhar já hoje.
-(maior) ooshh mãe, ce disse que ia fica o dia todo com nois
-(menor) dexa a mãe
-(mae) se eu disse isso falei errado filho, mas graças a deus já vou começar, amanha ja tem vale-refeiçao. vo te seguro saude...
-(maior) ve se tira 50 reais pra nois i passea no shopping, pega uma sessao de cinema
-(mae) sossega minino, mas tomara que de pra gente sai um final de semana por mes...agora descansa que ces tao com os zóio arriado.

Com certeza, se a definição de familia é diálogo, compreensão e união, presenciei um modelo ideal. São Paulo merece, em seu aniversário, histórias como essa - de uma das milhões de famílias que fazem essa metrópole ser, graças ao seu povo, insuperavelmente apaixonante.

3 comentários:

  1. que lindoo..... historias como essa, nos fazem rever o valor das coisas materiais !!
    Beijos

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  2. A pior coisa da vida adulta é a perda da inocência, da capacidade de apreciar e valorizar as cosias simples da vida com tamanha facilidade...

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  3. auhauahuhaa, "eu nunca vo colocar uma coisa medonha dessas!"!

    Sempre bom prestar atenção nas histórias que a cidade tem a contar.
    abraço!

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Uhmm... na verdade,