terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

O Futebol Pragmático versus o Futebol Cabalístico

por Victo José da Silva Neto

Santos e São Paulo fizeram um grande jogo. Talvez esse seja o mais interessante clássico do futebol paulista em anos. Justificarei. O São Paulo possui um plantel cheio de opções de meio campo, mas se sobram nomes, faltam qualidades destacadas. Seu sistema de jogo é europeu, apesar de ser o 3-5-2 mais próximo da perfeição que o futebol brasileiro já viu, com certeza seu espécime primordial na ultima década. O toque de bola, a solidez defensiva, os contra-ataques pelos pontas (Dagoberto, ou J. Wagner as vezes) (tendência também identificada nos clubes europeus - vide Manchester/Barça), o futebol sem erros, de qualidade tática suprema aliada à qualificação técnica, mas que também deixa de ser um atraente espetáculo, pois prima pela segurança e o passe certo, ao drible seco, à ginga e ao improviso.
Esses três últimos atributos pertencem ao jovial time do Santos. Mantendo a tradição de revelar grandes jovens com o que o futebol carrega de mais místico, ou seja, a arte de improvisar, que nada mais é que jogar naturalmente, como se jogam peladas, adaptando o drible à situação: a inventividade sobrepõe-se ao modelo pétreo, a movimentação é muito mais livre; a leveza e a velocidade atordoam os marcadores adversários.
Mas o Santos é mais do que isso. Pois reuniu gerações distintas dentro de um mesmo plantel. Conseguiu aliar a sofisticação extremamente simples que é o futebol arte - que se aprende genetica-hereditariamente no Brasil, tanto através de incentivos familiares quanto graças à uma tradição socio-cultural de grandes jogadores, da valorização do driblador como o verdadeiro boleiro - com a segurança de um meio campo respaldado por uma zaga confiável. Giovanni, Léo, Robinho, Ganso e Neymar. Ícones. Boleiros. Com a exceção de Ganso, que é de uma categoria ainda mais exclusiva. É o jogador que prevê, antecede a reação adversária aos seus próprios movimentos, e por isso joga fácil, tão fácil que parece não fazer esforço algum para enfiar bolas primorosas, puxar marcação ou abrir espaços impensáveis. É o jogador que, se não quiser, não perde a bola. Que sabe de ante-mão quando uma jogada é factível, quando deve passar, quando deve chutar, o resultado de cada ação já previamente calculado por uma espécie de análise imediata automática, que ocorre subconscientemente, elevando os jogadores que tem essa incrível capacidade crítica e de pensamento veloz, quando fundidos com uma habilidade e intimidade com a bola, à um nível superior. Esse é o jogador místico.
Foi para ver esse clássico, que de bom grado perdi o jogo do meu time, ou melhor, do juntado de onze que para minha indignação hoje compõe o alviverde. Torci para o Santos, e não esperava o segundo gol santista. Isso porque o São Paulo é um time extremamente competente. Dificílimo de ser batido. Já são quase seis anos jogando da mesma forma. E como quase só o São Paulo conseguiu efetivamente implantar a filosofia européia de jogo no Brasil, foram seis anos com um diferencial que o elevaram a categoria de papa-títulos. Como eu dizia, torcia para o Santos, muito pelo estilo de jogo deste, ousado e cativante. Robinho não deixou por menos. Seu gol é a síntese do jogo, e de um antagonismo que fará esse ano um dos mais interessantes no futebol nacional. O futebol pragmático sucumbiu, pela primeira vez em anos, ao geneticamente predisposto futebol cabalístico brasileiro.

2 comentários:

  1. Cada dia eu me impressiono mais com você...
    Falar de futebol é fácil, qualquer um faz, mas você o faz de uma maneira poética e romântica sem igual.

    Eu amo meu tricolor, eu acho impressionante a estabilidade e o alto rendimento que o time tem conseguido manter nos ultimos anos, mas eu sinto sim falta de um futebol arte. Dagoberto as vezes tenta dar um brilho a mais pro time, o Hernanes (de quem eu sou mega fã e suspeita de falar), mas em regra o São Paulo é um time, digamos, racional. Sem muita emoção e ciratividade. Pragmático mesmo.

    O Santos sim, o Santos joga co alegria, com brilho, com criatividade, sem medo de ser feliz. Eu tenho certeza que o muleque co Neymar e a molecagem do Robinho juntos vão dar muito trabalho e fazer brilhar novamento o futebol arte de qualidade.

    No fim das contas, o futebol pragmático não precisa necessariamente ser sóbrio e sério como tem sido do São Paulo. O jogo de domingo mostrou que o futebol arte também traz resultados e pode funcionar.

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  2. Muito bom, descordo com o desfecho do texto, pois o jogo demonstrou que os dois modos são bons, pois o gol de penalti, que ninguem pode falar que foi ou não foi. Foi um mero acaso, Sou sãopaulino e simpatizante do futebol jogado pelos jogadores do santos, pois é magia e o que é gostoso de ser ver mas o modo de jogar do SP também funcionou no jogo. O que prova mais uma vez que no futebol não tem certo nem errado.

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Uhmm... na verdade,